MULHERES NA CIÊNCIA: REALMENTE SOMOS POUCAS?

Competências: 1- Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa; 2- Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas.

Habilidades: 1 – Analisar processos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais nos âmbitos local, regional, nacional e mundial em diferentes tempos, a partir da pluralidade de procedimentos epistemológicos, científicos e tecnológicos, de modo a compreender e posicionar-se criticamente em relação a eles, considerando diferentes pontos de vista e tomando decisões baseadas em argumentos e fontes de natureza científica; 2 – Identificar e combater as diversas formas de injustiça, preconceito e violência, adotando princípios éticos, democráticos, inclusivos e solidários, e respeitando os Direitos Humanos.

Mulheres na Ciência: Realmente somos poucas?

Quando você pensa em ciência, quem é a primeira pessoa que te vem à cabeça? Na maioria das vezes, ouvimos nomes como Albert Einstein, Isaac Newton, entre outros (todos homens). Hoje você irá conhecer um pouco mais da história das mulheres na ciência. Vamos comigo? Inclusive, eu, que estou escrevendo este texto para você, sou uma mulher cientista. Talvez você esteja se perguntando o porquê de não conhecer muitas mulheres cientistas, mas já te adianto que somos muitas e que segundo dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), 13.419 cientistas mulheres se tornaram doutoras em somente no ano de 2019.

            Apesar de atualmente existir um maior número de mulheres que se destacam na ciência, não podemos ignorar que o acesso desigual à educação foi, e é ainda, em muitos países, um dos principais fatores da desigualdade entre homens e mulheres. Democratizar o saber e o acesso à educação está diretamente ligada a uma questão de poder, sobre quem detém ou não o conhecimento.  Não podemos nos esquecer que a maioria das mulheres até o começo do XIX  não sabia ler ou escrever e que somente uma minoria, que pertencia à aristocracia e a alta burguesia, acessava uma educação mais aprofundada.

Durante séculos os colonizadores – homens, brancos e europeus – quiseram deter o domínio sobre tudo o que se entendia por ciência e tecnologia, mesmo que isso implicasse no apagamento de muitas formas de conhecimento, o que chamamos de epistemicídio. Apesar da tentativa de apagamento, a história sempre esteve repleta de mulheres que desempenharam importantes papéis nas ciências, na literatura, na filosofia, na medicina e em diversas outras áreas. Isso nos mostra que o fato de não conhecermos muitas mulheres cientistas não está ligado a uma falta de capacidade das mulheres em exercer determinadas funções, mas sim a um estereótipo criado, o qual associa a mulher somente aos trabalhos domésticos.

            Esse estereótipo ligado às mulheres, principalmente na sociedade ocidental, consolidou uma ideia de que as mulheres tinham capacidade cognitiva inferior a dos homens. Com isso, muitas delas tiveram que desenvolver seus trabalhos na sombra de uma figura masculina, seja um irmão ou marido, como contam Kovalesk et al. (2016), contribuindo para o esquecimento da história de inúmeras mulheres que dedicaram suas vidas ao conhecimento.

            Lembra que eu te expliquei ali atrás sobre o epistemicídio e que se trata de uma forma de se apagar conhecimentos? Então, senta que lá vem história! Durante séculos as mulheres dominaram saberes e práticas que não foram considerados científicos, como nos conta Sartori (2006), e por isso muitas dessas mulheres chegavam a ser consideradas feiticeiras. Um exemplo disso é a medicina, por exemplo, pois eram as mulheres que sempre faziam curativos, administravam remédios e descobriam plantas medicinais. Essas formas tradicionais de cuidado eram tão eficazes como o que conhecemos hoje como a medicina oficial.

            O historiador Jules Michelet (1878) explica que durante séculos a feitiçaria foi a única forma de acesso da população aos cuidados com a saúde. A nobreza e o clero ainda conseguiam acessar técnicas de medicina oriundas dos mouros e judeus de Salerno[1], mas a maioria da população tinha os cuidados com a saúde garantidos por meio de sábias mulheres que exerciam a função de parteira ou curandeira.                  

No decorrer da história, além dos cuidados ligados à saúde, mulheres de diferentes partes do mundo foram responsáveis por outras grandes ações e descobertas. Por volta de 8000 a 4000 anos a.C., as mulheres do Tigre e Eufrates foram quem descobriram a cevada, o linho. Na China, foram as mulheres que descobriram as técnicas mais adequadas para o cultivo do arroz e na América, por sua vez, as técnicas de cultivo adequadas às batatas e ao milho também foram descobertas femininas (SCHIEBINGER, 2001, 2003; SARTORI, 2006).

            Se observarmos, as divindades femininas cultuadas na antiguidade eram associadas a importantes formas de conhecimento. No Egito, por exemplo, conhecimentos como a escrita, a medicina, a alquimia, o embalsamamento, a agricultura e o preparo do pão são legados de Ísis, a mãe de todos os deuses. Na cultura grega, a deusa Atena é a responsável pelo arado puxado por bois e pela criação do óleo de oliva, enquanto Deméter é a divindade que responde pela fertilidade e pela colheita.  A agricultura estar ligada a divindades femininas não se trata de uma coincidência, mas sim de um dado histórico que nos revela o importante papel das mulheres no desenvolvimento de técnicas agrícolas.

 

[1] Província Italiana, localizada  na região conhecida como Campânia.

Figura 1 – Colagem da Deusa Ísis

Como eu disse no começo do texto, as mulheres guardam uma relação com a ciência desde a antiguidade. As regiões da Assíria[1] e do Egito (país do continente africano), por exemplo, contavam com escolas de medicina destinadas às mulheres. A Assíria foi berço da primeira mulher química que se tem conhecimento, seu nome era Tappouti, a qual viveu por volta de 1200 a.C. Essa cientista foi responsável por dirigir a fábrica de perfumes do palácio real de Babilônia.

  A rainha Hatchepsout, do Egito, era uma mulher médica que, comprometida com o avanço das técnicas medicinais, organizava expedições para a costa da Somália em busca de novas plantas medicinais. Foi também do Egito que surgiram alguns dos primeiros registros medicinais ginecológicos, que eram elaborados e praticados exclusivamente por mulheres. Essas médicas se especializavam nestas técnicas e diagnosticavam a gravidez, realizavam cesáreas e operações de câncer de mama, além de também cuidarem de problemas como cólicas menstruais e esterilidade (SARTORI, 2006).

            Depois de te contar sobre todas essas mulheres cientistas que atravessaram a história, você percebeu que as mulheres sempre estiveram envolvidas na produção de técnicas e conhecimento em prol de trazer melhorias para suas sociedades? Um exemplo atual de cientista responsável por um avanço importante para o mundo todo é a brasileira Jaqueline Goes de Jesus. Jaqueline integrou a equipe responsável por mapear os primeiros genomas do novo coronavírus (SARS-CoV-2) no Brasil e em tempo recorde. A descoberta foi feita apenas 48 horas após a confirmação do primeiro caso de Covid-19 no país, enquanto os outros países do mundo levavam uma média de 15 dias para realizar este mapeamento. Descobrir essa sequência permitiu que as diferenças entre os genomas do vírus que chegou ao Brasil e o do vírus identificado em Wuhan, na China.

 

[1] Antiga civilização localizada na região mesopotâmica, entre os rios Tigre e Eufrates. A Mesopotâmia, atualmente, corresponde aos territórios do Iraque, Irã e Jordânia, no Oriente Médio

Figura 2 – Colagem de Jaqueline Goes de Jesus

O SAT também conta com a prática de consorciação de culturas e rotação de culturas, criando sinergia entre plantas que usufruem de copas em diferentes alturas, raízes em profundidades diferentes e necessidades que se complementam. Para dar um exemplo dessa inteligência agrodinâmica, Elizângela da Silva Costa do povo baré comenta que “o povo branco irriga aquilo lá, irrigação chama né. Nós não, a irrigação é esse aqui, os abacaxis, por isso toda roça tem abacaxi porque ele é vaso de água pra eles consumirem, seja no inverno ou no verão” (NATIONAL GEOGRAPHIC BRASIL, 2022. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=mOV6JXqY5r4&ab_channel=NationalGeographicBrasil).

Desse modo, além do cultivo de mandioca e suas variedades, na roça também havia cará, batata-doce, tajá, jerimum, melancia, cana-de-açúcar, abacaxi, milho, arroz, fava, amendoim, tabaco, pimenta, algodão, banana, urucum, mamão. Ao redor das casas costuma-se plantar árvores frutíferas. A seleção das sementes, cuidado da roça e escolha das plantações, ou seja, as mulheres indígenas são protagonistas nessa atividade fundamental da comunidade.

Após um período de dois a oito anos de uso da roça, a depender da região, esse espaço entrará em um período de pousio, que é um período de descanso que dura em torno de 10 a 20 anos. Neste modo de pensar o mundo, de medir a passagem do tempo e experienciar os ciclos culturais e biológicos, o período de recuperação do solo e da floresta é considerado rápido pelos produtores (SIMINSKII; FANTINI, 2007). 

Em contraste, no modelo do agronegócio o solo é utilizado até o seu esgotamento completo. Neste caso, o solo pobre tem poucas condições de se regenerar naturalmente, aumentando os processos de erosão, assoreamento dos rios e logo o empresário busca outro solo fértil que possa ser utilizado novamente sem qualquer responsabilidade com a sustentabilidade produtiva e ecológica.

Próximos Tópicos

Unidade Amor é latifúndio, sexo é invasão – Relações afetivas / sexualidade/ história/biologia