RACISMO AMBIENTAL

No texto “Periferia é periferia em qualquer lugar: injustiça ambiental”, vimos que as consequências da devastação do meio ambiente não recaem igualmente sobre todas as pessoas. Nas grandes cidades, por exemplo, as periferias sãoatingidas de forma desproporcional pela falta de água, acúmulo de lixo e ausência de saneamento básico. Você já paroupara pensar quem são os moradores desses lugares?

Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2019 mostrou que as pessoas negras têmrenda 74% menor do que brancos. Essa diferença, atrelada a outros fatores sociais, reflete no acesso a bens, serviços públicos e territórios. Por exemplo, o saneamento básico, elemento importante do planejamento urbano e da políticaambiental, é um grande problema para muitas pessoas de diferentes regiões do país. No entanto, quando olhamos paraessa questão através de uma lupa racial, percebemos que há diferenças consideráveis entre grupos étnico-raciais: 45%da população afro-brasileira não tem acesso a saneamento básico, já entre a população branca esse percentual é deapenas 28%. Ou seja, há uma desvantagem substancial da população negra em relação a essa política urbana, sanitária e ambiental. Nesse caso, dizemos que há uma situação de racismo ambiental.

A ausência de saneamento básico leva a poluição de corpos d’água, do solo, do ar, além de aumentar a proliferação de doenças. Quando a população de um bairro periférico, de uma quebrada, não tem acesso a saneamento básico, ela estásendo atingida de forma desproporcional por todos esses problemas ambientais. Essa situação ocorre cotidianamentenas periferias das cidades, em aldeias indígenas, em quilombos, em comunidades ribeirinhas e outros gruposhistoricamente oprimidos.

Quilombos, aldeias e roças

“Quando essa natureza se acabar, o que é que nós vamos fazer? Vamos se acabar também”. O Brasil é um país fundado no racismo e assombrado por ele em todos os aspectos políticos, institucionais e interpessoais. Assim, não é de se espantar que o racismo atue como elemento definidor da chamada crise do meio ambiente e que os agentes produtores dela não sintam as consequências da mesma forma que determinadas populações marginalizadas. Esses grandes geradores são os países chamados de “desenvolvidos” e as elites econômicas, que também são racializados, ou seja, são formados majoritariamente por pessoas brancas. 

Dessa maneira, o racismo ambiental impacta uma série de grupos que veem seus direitos negados e suas vidas desrespeitadas. Trata-se de situações dramáticas observadas em aldeias, quilombos, roças e florestas que culminam no extermínio de vários grupos. Assista ao vídeo abaixo que discute as situações de racismo ambiental a que estão sujeitos os moradores do quilombo Santa Rosa dos Pretos, no Maranhão.

Observe no vídeo que a falta de água, a falta de comida e a invasão dos grandes empreendimentos são todos consequências ambientais do chamado “desenvolvimento”, que prejudica a comunidade e coloca em risco constante os seus moradores. Esse quilombo sofre, de forma injusta, com os desdobramentos da tragédia do meio ambiente produzida pelas elites brancas. Portanto, ocorre racismo ambiental. 

Dando sequência ao argumento, outra situação frequente são os casos incontáveis de racismo ambiental que povos indígenas brasileiros experienciam. A invasão de suas terras, a contaminação das águas e dos solos e a construção de hidrelétricas mostram como os povos originários são vítimas de injustiças ambientais. Atualmente, um dos casos mais emblemáticos acontece na Terra Yanomami, em Roraima. Os rios desse território estão contaminados com uma quantidade de mercúrio (metal altamente tóxico utilizado no garimpo ilegal)  8600% superior àquilo que é apropriado ao consumo humano. Veja o vídeo abaixo que trata da situação dos Yanomamis.

Perceba que os indígenas yanomamis sofrem com uma série de injustiças: a presença do garimpo ilegal em suas terras, a contaminação por mercúrio de suas águas e a negligência dos órgãos públicos quanto a situação criminosa a que estão expostos. Todas essas injustiças podem ser interpretadas como racismo ambiental, pois temos um grupo historicamente discriminado, os indígenas, sofrendo com graves problemas ambientais que não foram gerados por eles. Por fim, vale ressaltar a falta de políticas públicas e fiscalizações efetivas para tratar essa questão.

As quebradas

As periferias brasileiras, bairros frequentemente de maioria negra, também sofrem de forma injusta com os danos da crise ambiental. As populações afro-periféricas são as mais afetadas com a falta de saneamento básico, acúmulo de lixo, áreas perigosas para moradia e outros fatores que são consequências dos desequilíbrios ambientais causados pelo “desenvolvimento”. A falta de água, por exemplo, é um problema constante. Assista ao vídeo do portal Brasil de Fato sobre a falta de água nas periferias e seus impactos durante a pandemia de Covid-19.

No texto “Periferia é periferia em qualquer lugar: injustiça ambiental”, apresentamos um dado importante: na cidade de São Paulo, os lugares que mais gastam água são os bairros de elite, de maioria branca, já os espaços que gastam menos água são os bairros periféricos. No entanto, a crise hídrica atinge somente as quebradas. Por que em meio a esse dilema não falta água para os bairros nobres? Novamente temos uma situação de racismo ambiental em que o povo da quebrada é prejudicado de forma desigual pela falta de água, fator que gera problemas sanitários e insegurança alimentar.

Identificando casos de racismo ambiental para discuti-los e combatê-los!

Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz criaram um mapa interativo que identifica conflitos envolvendo injustiça ambiental. A maioria diz respeito ao racismo ambiental em todo o Brasil. Aproximando as localidades e clicando sobre os pontos marcados no mapa, uma nova janela é aberta para informar todos os dados daquele caso específico e o contexto do conflito. 

Navegue pelo mapa, explore os conflitos, procure sua região e verifique se há situações envolvendo injustiça e racismo ambiental. É importante compreendermos os problemas sociais que nos afetam, conhecermos suas raízes, pois assim poderemos nos engajar de maneira informada nas múltiplas lutas diárias que enfrentamos. 

Mapa de Conflitos envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil: https://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/

FALTA de água nas periferias evidencia desigualdade em meio a pandemia. S.I.: Brasil de Fato, 2020. (4 min.), color. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sNRvBZowMjQ. Acessado em 04 de novembro de 2022.

 

G1. Jardins consomem quase 50% mais água do que média da cidade. 2015. Disponível em: https://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/04/jardins-consomem-quase-50-mais-agua-do-que-media-da-cidade.html. Acessado em 22 de setembro de 2022.

 

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. Estudos e Pesquisas: Informação Demográfica e Socioeconômica, S.I., v. 1, n. 41, p. 1-12, jan. 2019. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf.  Acessado em 05 de Outubro de 2022.

 

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Retrato das desigualdades de gênero e raça. Brasília: Ipea, 2011.

 

INTERFACES do Racismo: Racismo Ambiental. 2018. Son., color. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3IxobCS1n-k. Acessado em 04 de novembro de 2022.

 

RAMALHO, Yara; OLIVEIRA, Valéria; MARQUES, Marcelo; ABREU, Luciano. Rios na Terra Yanomami têm 8600% de contaminação por mercúrio, revela laudo da PF. 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2022/06/06/rios-na-terra-yanomami-tem-8600percent-de-contaminacao-por-mercurio-revela-laudo-da-pf.ghtml. Acessado em 22 de setembro de 2022.


SOUZA, Arivaldo Santos de. Direito e racismo ambiental na diáspora africana: promoção da justiça ambiental através do direito. Salvador: Edufba, 2015. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/handle/ri/35662. Acessado em 13 de setembro de 2022.