Periferia é Periferia Em Qualquer Lugar
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PERIFERIA É PERIFERIA EM QUALQUER LUGAR: INJUSTIÇA AMBIENTAL
“Periferia é periferia em qualquer lugar” já disse o poeta. Chamamos de periferia bairros pobres, frequentemente negros, que estão afastados dos centros das cidades. Historicamente, esses espaços sofrem com um abandono por parte do poder público, o que leva à proliferação de uma série de problemas sociais e ambientais. Observe a figura abaixo:
Procure caracterizar o que você enxerga na imagem com a maior quantidade de detalhes possível. A fotografia é de um bairro periférico nos arredores da cidade de Brasília. O esgoto a céu aberto (dejetos jogados em meio à natureza e à população) é um problema comum no nosso país porque muitos bairros não possuem saneamento básico e encanamento adequado. Como consequência disso, ocorre a poluição do solo, das águas, do ar e a proliferação de doenças.
E por que as periferias sofrem constantemente com essa situação? Bem, os problemas ambientais que atingem esses locais são parte de uma série de adversidades mais amplas que essas regiões enfrentam e que você provavelmente conhece muito bem. Ouça a música Fim de semana no parque, dos Racionais MC’s, e preste atenção na parte destacada aqui:
“A número número 1 em baixa renda da cidade
Comunidade zona sul
É dignidade
Tem um corpo no escadão
A tiazinha desce o morro
Polícia, a morte!
Polícia, socorro!
Aqui não vejo nenhum clube poliesportivo
Pra molecada frequentar nenhum incentivo
O investimento no lazer é muito escasso
O centro comunitário é um fracasso
Mas aí se quiser se destruir está no lugar certo
Tem bebida e cocaína sempre por perto
A cada esquina, 100, 200 metros
Nem sempre é bom ser esperto
Schimth, Taurus, Rossi, Dreyer ou Campari
Pronúncia agradável
Estrago inevitável
Nomes estrangeiros que estão no nosso meio pra matar”
Na letra, Mano Brown descreve algumas das violências e injustiças cotidianas da vida periférica: a morte, a falta de lazer, o incentivo ao consumo excessivo de drogas. Todos os bairros de uma cidade sofrem de forma homogênea com esses problemas? Nessa mesma música, os Racionais comparam um final de semana em regiões de elite com um final de semana na favela, mostrando as diferenças discrepantes entre os espaços. Dessa forma, podemos constatar que as comunidades, com sua população majoritariamente negra, são preferencialmente alvos de injustiças sociais. Se nos bairros de classe média não falta água, nas periferias existe uma escassez da mesma. Enquanto os bairros de classe média possuem coleta regular de lixo, encanamento e tratamento de esgoto, as quebradas padecem com acúmulo de lixo, esgoto a céu aberto e fornecimento de água suja e contaminada. Sendo assim, as populações periféricas estão expostas a diversos problemas de ordem ambiental. Quando temos determinados grupos experienciando, de forma desproporcional, as consequências da destruição desenfreada da natureza, chamamos isso de injustiça ambiental.
Agora, ouça a música Chuva Ácida, do cantor e compositor Criolo e, a partir disso, reflita sobre as injustiças ambientais presentes na sua quebrada.
Pode-se dizer que boa parte dos problemas ambientais citados pelo rapper atinge de forma desvantajosa populações vulnerabilizadas, como povos indígenas, quilombolas e tradicionais. É importante observar que os principais produtores de poluição e destruição ambiental não são os mesmos que sentem as consequências mais brutais desse processo. Os rios da terra Yanomami no Amazonas, por exemplo, foram poluídos com mercúrio que, consequentemente, levou a uma contaminação de grande parte dos indígenas da região. Mas quem jogou este metal nos rios? O garimpo ilegal que persiste na região há décadas. Portanto, se os indígenas yanomamis estão sendo vítimas de um problema ambiental que não foi gerado por eles, tem-se uma situação de injustiça ambiental.
Segundo uma reportagem publicada no portal de notícias G1 em 2015, o bairro dos Jardins em São Paulo, um território elitista, foi considerado o que mais consumia água na cidade, com uma média de uso cinquenta por cento maior que outros bairros. Já o Grajaú, um bairro periférico, obteve o menor gasto no município. O uso excessivo de água é feito pelos bairros de elite, cuja maioria é branca; no entanto, quem paga o pato são os bairros periféricos que sofrem constantemente com a falta desse recurso natural. Embora as pessoas que vivem em áreas não centrais sejam as que menos contribuem com o problema, infelizmente são elas as mais afetadas. Isso é injustiça ambiental.
Torna-se necessário, então, compreender as raízes dos problemas cotidianos que vivemos e enfrentar os fatores que contribuem para as injustiças ambientais através de uma participação concreta no debate público. Vale ressaltar que, nessa perspectiva, a periferia não é compreendida como resultado daquilo que as elites e o Estado fazem dela, mas como espaço fértil de (re)criação, resistência e resiliência capaz de agenciar, por meio de seus habitantes, a existência de políticas públicas efetivas. Como já disse Brown:
“Milhares de casas amontoadas
Ruas de terra esse é o morro, a minha área me espera
Gritaria na feira: vamos chegando!
Pode crer, eu gosto disso, mais calor humano
Na periferia a alegria é igual
É quase meio dia, a euforia é geral
É lá que moram meus irmãos, meus amigos
E a maioria por aqui se parece comigo
E eu também sou o bam bam bam e o que manda
O pessoal desde às 10 da manhã está no samba
Preste atenção no repique e atenção no acorde: Como é que é Mano Brown?
Pode crer, é pela ordem”
Identificando casos de racismo ambiental para discuti-los e combatê-los!
Para saber mais sobre o consumo e a falta de água na cidade de São Paulo consulte:
G1. Jardins consomem quase 50% mais água do que média da cidade. 2015. Disponível em:
https://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/04/jardins-consomem-quase-50-mais-agua-do-que-media-da-cidade.html. Acessado em 22 de setembro de 2022.
PORTO, Raquel. Por que as periferias são as mais afetadas pela crise da falta de água em SP. 2021. Disponível em: https://www.agenciamural.org.br/por-que-as-periferias-sao-as-mais-afetadas-pela-crise-da-falta-de-agua-em-sp/. Acessado em 22 de setembro de 2022.
Para saber mais sobre a contaminação por mercúrio na terra yanomami consulte:
RAMALHO, Yara; OLIVEIRA, Valéria; MARQUES, Marcelo; ABREU, Luciano. Rios na Terra Yanomami têm 8600% de contaminação por mercúrio, revela laudo da PF. 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2022/06/06/rios-na-terra-yanomami-tem-8600percent-de-contaminacao-por-mercurio-revela-laudo-da-pf.ghtml. Acessado em 22 de setembro de 2022.
CRIOLO. Chuva Ácida. São Paulo: Oloko Records, 2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=F_baCPBeWNk. Acessado em 04 de novembro de 2022.
HERCULANO, Selene. O clamor por justiça ambiental e contra o racismo ambiental. Interfacehs: Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente, São Paulo, v. 3, n. 1, p. 1-20, jan. 2008. Disponível em: http://www3.sp.senac.br/hotsites/blogs/InterfacEHS/wp-content/uploads/2013/07/art-2-2008-6.pdf. Acessado em 13 de setembro de 2022.
NASCIMENTO, Bruno Lopes. RACISMO AMBIENTAL E GEOGRAFIA: UMA ABORDAGEM POSSÍVEL? Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), [S.l.], v. 14, n. Ed. Especial, p. 9-24, jun. 2022. ISSN 2177-2770. Disponível em: https://abpnrevista.org.br/index.php/site/article/view/1337. Acessado em 26 de setembro de 2022.
RACIONAIS. Fim de semana no parque. São Paulo: Zimbabwe Records, 1993. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=KqLSnQ7V4U8. Acessado em 06 de Novembro de 2022.
SOUZA, Arivaldo Santos de. Direito e racismo ambiental na diáspora africana: promoção da justiça ambiental através do direito. Salvador: Edufba, 2015. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/handle/ri/35662. Acessado em 13 de setembro de 2022.